domingo, 7 de setembro de 2008

O Jogo do Contente


Se esse blog tivesse sido "construído" há 15 anos atrás, o tema do layout provavelmente seria bem diferente e sua personagem principal seria outra pequena sonhadora irremediável que marcou minha infância: Poliana, personagem do livro homônimo de Eleanor H. Porter, escrito em 1913. Na época, e antes daquela época também, o livro era passado de mães para filhas, era uma espécie de "tesouro literário do sexo feminino". Não sei hoje em dia, mas quando eu era criança ainda meninas eram nomeadas Poliana por causa desse livro, e quase toda casa tinha uma cópia dele. A minha não era diferente, não lembro de onde ele surgiu nem como caiu nas minhas mãos, mas lembro de devorar o livro diversas vezes seguidas, lá pelos meus oito anos de idade. E, naquela época, eu queria ser Poliana.

Não sei se os garotos conhecem o livro, e devem existir meninas mais novas que eu que também não sabem o porquê do fascínio que ele despertava em mim e nas otimistas que vieram antes de mim, então segue uma pequena sinopse: 

"A pequena Beldingsville, uma típica cidadezinha do início do século XX na Nova Inglaterra, Estados Unidos, nunca mais seria a mesma depois da chegada de Polianna, uma órfã de 11 anos que vai morar com a tia, a irascível e angustiada Polly Harrington. Por influência da menina, de uma hora para outras tudo começa a mudar no lugarejo. Tia Polly aos poucos torna-se uma pessoa melhor, mais amável, e o mesmo acontece com praticamente todos os que conhecem a garota e seu incrível ‘Jogo do Contente’. Uma otimista incurável, Poliana não aceita desculpas para a infelicidade e emprenha-se de corpo e alma em ensinar às pessoas o caminho de superar a tristeza."

Poderia ser um livro piegas e bobo, mas a doçura com que a autora construiu a personagem fez com que a história de Poliana passasse longe de ser um dramalhão bem-intencionado.  A menina não é boba, não é inocente além da conta, não sofre de auto-piedade e não é, nem de longe, o modelo perfeito de criança. Ao contrário, é espivitada, curiosa, atrevida, espirituosa e determinada. Teima quando acha que está certa e tenta fazer tudo que está ao seu alcance para que as coisas saiam da forma que ela quer. Mas, apesar disso, é sempre doce e amável com todos e seu jeito espontâneo é o que acaba cativando todo mundo que convive com ela: da tia austera ao reverendo da cidade, o amigo Jimmy, a empregada Nancy e Timothy, filho do jardineiro, e, claro, os dois "reis" da rabugice, Mrs. Snow e John Pendleton. Todos eles se rendem ao seu famoso jogo, tema do post de hoje, o "Jogo do Contente".

Várias passagens desse livro não saíram nunca mais da minha cabeça, mas em especial está aquela em que Poliana explica a Nancy no que consistia o Jogo do Contente, o jogo onde o grande desafio é encontrar a felicidade em todos os momentos, mesmo nas pequenas coisas e ainda quando parece não existir motivo nenhum para ser feliz. Ela conta a Nancy que o pai, um pobre missionário, foi que havia ensinado o jogo num dia em que ela esperava receber uma boneca de presente das senhoras da caridade, mas tudo que veio nas doações foi um par de muletinhas. Então, pra tentar driblar a tristeza da filha, o pai a instigou a encontrar um motivo pra ficar contente com aquele presente (no caso, o fato de não precisar das muletas). Começava aí o grande triunfo de Poliana em relação a todas as outras pessoas que cruzavam seu caminho: o reconhecimento e o valor das pequenas alegrias do dia-a-dia. Não é o otimismo utópico, não é aquele sentimento que a velha máxima encerra, "no final tudo dá certo", não é uma fuga da realidade; é uma nova forma de enxergar o mundo e o que acontece nele, procurando focar no melhor de cada coisa e de cada ser. 

Eu não sei se aprendi com Poliana ou se nasci assim, mas sei que me identifiquei muito com essa forma de ser e passei a, eu mesma, jogar o Jogo do Contente pela vida a fora. Claro que é mais fácil quando se é criança, pelo menos na minha infância os problemas nunca eram grandes o suficiente para me fazerem duvidar da eficácia do jogo. Eu sofria, claro, mas usava os "truques" do Contente para aliviar a minha dor e a dos outros, se estivesse ao meu alcance (Poliana foi uma boa professora!). Foi assim quando eu sofri o acidente que me custou um dente permanente e dois outros ficaram comprometidos; coisa de criança, cair e se arrebentar toda, mas acabou tendo conseqüências mais sérias e foi motivo de certa preocupação dos meus pais. "Ser firme e forte", era meu pensamento, "não chorar se não precisar e agüentar a vinda ao dentista, porque, pelo menos, eu tinha conseguido manter meus dentes, imagina se eu tivesse que ficar banguela?" Algumas situações eram mais complicadas que essa, algumas tristezas eram muito difíceis de serem superadas, mas o "pelo menos" ficava martelando na minha cabeça, tentando encontrar um motivo que me deixasse um pouco menos triste pelo que quer que fosse.

Eu cresci e o jogo continuou... Já não conseguia mais me livrar do "pelo menos". Ainda hoje, mesmo quando alguma coisa dá muito errado ou algo acontece que me deixa em pedaços, a minha primeira reação é tentar achar um compensatório na situação, algo que não me deixe sentir tão miserável. Não sei até que ponto é bom jogar o Jogo do Contente em todas as situações; talvez fosse importante encarar uma situação problemática com todo peso que ela tem, talvez seja a forma menos imparcial de se proceder na hora de tentar soluções para os problemas. Talvez, um dia, exista uma situação em que eu não consiga aplicar o "pelo menos" e me sinta perdida e sem chão... Mas já antevejo a minha mente infantil entrando em cena e a me fazendo lembrar de como sempre existe uma forma menos escura de encarar os meus problemas, e invocando o meu lado Poliana para tomar conta da situação. 
É, não tem jeito, acho que eu também sou uma otimista incorrigível!
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Para quem quiser ler o livro, ele está disponível gratuitamente na net AQUI.

O livro também virou um filme da Disney em 1960 (com Hayley Mills ganhando um Oscar honorário como Pollyanna) e eu, claro, também assisti. Pena que hoje em dia é difícil de encontrá-lo, mas sei que existe em DVD. Duas cenas que eu gosto muito do filme (e que consegui achar no You Tube) AQUI.

16 comentários:

Leandro Neres disse...

A forma como descreveu Pollyanna e sua importância para tirar alívio das situações difíceis da vida me deixaram instigado a dar uma lida no livro, rsrs...
Esse livro já tinha ouvido falar, numa situação complicada, até... No ano de 2000, mais precisamente no primeiro semestre, de março a junho passei a morar em Londrina - PR. Recém chegado na cidade "grande" e calouro universitário "bixo do mato" sofri um tantão com o novo ritmo de facul e o lugar onde estava morando, um pensionato em que morava desde estudandes a senhores aposentados e uma família. Esta família encontrava-se numa crise tremenda, eles eram de MG, mas o seu Nelson, Eng. Mecânico, havia perdido seu emprego e resolveu arriscar a vida no Sul, as coisas só foram piorando, até que foram parar neste pensionato, estavam todos morando num quarto muito pequeno. De imediato me identifiquei com eles, eram muito amigáveis, ajudava como podia eles, e a senhora, Márcia, apresentava uma tristeza aparente, mas sempre tinha um brilho, uma certa esperança... Não foi só o fato deles morarem num quarto pequeno, mas todo o contexto, o marido não a deixava trabalhar, para ele a responsabilidade deles terem perdido tudo era unicamente dele, então ele iria os tirar desta situação complicada... Mas isto só vinha a causar mais conflitos.. Passei a ajudar o Flávio com coisas de escola, ajudava-os como podia, ouvia muitas histórias deles, da época em que tudo ia bem... Acabei ganhando, na época, quase que uma família, ela me dava conselhos bacanas, até hoje lembro de alguns ensinamentos...
Seu Nelson trabalhava o dia todo numa fábrica e a noite numa outra empresa, um dia a noite acabei presenciando uma discussão entre eles na cozinha do pensionato, não reagi, mas minha presença os fez parar. No outro dia, ela estava muito triste e me falou deste livro, eu gostava muito deles todos acabei sofrendo com a situação deles... Ela me falou sobre Pollyanna, sobre como era importante encontrar alegria, me recomdendou a ler... Eu fui até a biblioteca, encontrei o livro mas não o li, tinha tanta coisa na cabeça... Mas hoje lendo teu post me lembrei disto, de muita coisa deles, senti saudades e me impressionei até, rs. Porque a senhora devia ter uns 45 anos e tinha lido este livro na infância também, impressionante como aqueles ensinamentos ficaram com ela, creio que para vida toda...
Enfim, me empolguei contando a história deles, mas achei legal como essas coisas são importantes para nós, principalmente aquelas aprendidas quando criança...
Até
Bejos!
Leandro

Leandro Neres disse...

Nossa, ignore os erros de português e a história confusa kkk
Bjs

Lorena disse...

Não foi confusa, e eu gostei muito de sabê-la! Poxa, que história, me comoveu até... Espero que essa família esteja bem.
E Poliana é marcante mesmo, principalmente quando lido na infância, não tem como se passar imune por ele... Se vc quiser dar uma olhada, é só baixar a versão que eu postei. A tradução é portuguesa, mas a magia é a mesma. =)
beijos!

Éverton Vidal Azevedo disse...

Nunca li Poliana apenas um resumo. Uma ex me falou muito sobre ele, foi um dos livros que marcou a vida dela.

Agora depois do teu texto, sabe que até me deu uma vontadezinha de ler? Ele carrega boas liçoes, com o pé no chão, na realidade.

Que beleza Lorena. Que bom que você também disponibilizou o link. Acho que vou começar pelo filme :D.

Bj.

Agda Gabriel disse...

Será que alguma pessoa que tenha aprendendido a amar os livros na infância, tenha deixado de ler os livros de Pollianna? Eu fui uma criança mais feliz por causa deles, certamente, mas o tempo passou e apesar de ainda tentar ver sempre algo de positivo nos fatos, confesso que as vezes é impossível. Entretatano o livro é belissimo, a hístoria é rica em emoçoes e personagens. Vale a pena ler de novo? Quem sabe...livros também me deixam cheia de saudade. Beijos Lorena

Maya disse...

Ei, Nenena... eu tenho uma edição ilustrada de luxo em inglês, capa e talz... você quer?

Lorena disse...

É, sério, Pri??? Puxa!! Quero demais da conta! =D

Amigao disse...

Eu acho que li sim os livros da Poliana menina e da Poliana moça.
Sei la não lembro bem.
Mas eu confesso, eu não pratico bem o jogo do contente.Sou mais adepto de um jogo que eu mesmo criei, o "jogo do bobão".
Sou bobão sim e sou feliz.

Beijão linda!

Dulce Miller disse...

Lô, esse livro marcou a minha vida e com certeza aprendi muito com a Pollyanna!
Você leu o Pollyanna Moça? Não é tão instigante quanto o primeiro, mas também é lindo...

Nem sabia que tinha virado filme =/

Beijão, minha querida!

Adriano Caroso disse...

Sempre ouvi falar neste livro e tenho muita vontade de lê-lo. Vou visitar este link. E o seu texto, como sempre, um primor. A história de Leandro também hein! Linda. Ele devia publicá-la com mais detalhes. Não acha?
Beijos

Thais disse...

Sexta passada assisti Amélie, e me lembrei muito de vc!!! =D
Foram tantas sensações desde a ultima vez q viiii!=O

Dpois volto! Agora minha perna dói! Aff! ¬¬

;*

Rosi disse...

Menina, que emoção
Eu li esse livro quando tinha uns 11 anos, foi indicação de um amor adolescente e como foi importante pra mim.
Seu texto me inspira a escrever um sobre o assunto. Prometo que mencionarei o seu.
Obrigada pelas doces lembranças.
Um forte abraço

Unknown disse...

eu não li polyana,uma amiga me falou sobre ela no ensino fundamental... numa situação muito triste na minha vida ela me apresentou o jogo do contente... O jogo funcionou por um bom tempo... agradeço até hoje por existir a polyana, acho que todo criaça deveria ler, dáuma pespectiva tão diferente do mundo.

:)
gstei muito do seu blog viu!

- Tatah * disse...

Parabéns pelo seu blog tah?!
Estava precisando muito de um resumo do livro Pollyanna e uma alma caridosa me ajudou!!!
Boa sorte com o blog :)

Bjos ♥

Anônimo disse...

Isso me ajudou muuuito, eu precisa deste livro e na véspera eu consigo um resumo que apesar de nao ter tudo, me ajudo pra caramba.
um beijo :*

Edna Liepkan disse...

Amei! Tambéns sou fã de Pollyana, tb escrevi sobre ela no meu blog.
http://experienciasnavida.blogspot.com/
Vi um dos comentários sobre edição ilustrada! Nossa, gostaria muito de obter para contar para as crianças com figuras! Quanta lição de vida de um modo doce e emocionante! parabéns!